…e Maringá cresceu em torno de Juvêncio

Luiz de Carvalho

 

“Daqui deste lugar eu vi a cidade crescer em volta de mim. Ali, onde está aquele prédio luxuoso era um terreno baldio, depois veio a cerca de tapume, chegaram os primeiros trabalhadores e algum tempo depois a construção apareceu por cima do tapume, foi crescendo, crescendo até chegar a esse edifício. Ali foi construída a rodoviária e durante décadas foi um entra e sai de pessoas até que ela foi fechada e hoje é um prédio grande e vazio. Logo vai deixar de existir, como tantos outros que já existiram por aqui.”

Foto divulgada no facebook por Jeremias Puliquezi

Assim o pioneiro Juvêncio Aurélio Pereira* fala de suas lembranças quando alguém pergunta se faz muito tempo que ele tem seu carrinho de frutas na esquina das ruas Joubert Carvalho e Júlio Mesquita, em frente à antiga rodoviária. “Estou neste lugar  há 46 anos, mas a verdade é que estou nesta rua há 63, com idas e vindas.” Viu Maringá deixar de ser um lugarejo no meio da mata, sempre envolvido numa nuvem vermelha de poeira ou num lamaçal grudento que assustava quem  chegava, para se transformar numa metrópole. E lá está ele, bem no coração da metrópole, vendo pessoas surgirem e desaparecer, empresas serem abertas e logo sendo substituídas por outras, prédios nascerem e tempos depois serem derrubadas dando lugar a outros mais suntuosos.

Juvêncio nasceu em Itaperuna (RJ) e desde cedo se considerou um peão de trecho, um aventureiro em busca de lugares novos em que pudesse fugir da vidinha simples de sua cidade natal. A abertura do norte do Paraná pela Companhia Melhoramentos foi amplamente divulgada e atraiu gente do Brasil inteiro. Ele foi um dos que não resistiram às notícias sobre uma terra roxa em que se plantando tudo dá. Com 20 anos de idade, sozinho, pouco dinheiro e muitos sonhos, ele desceu de um ônibus no Maringá Velho em 1950 para iniciar sua vida de pé vermelho. Na época, na avenida Brasil, que era uma espécie de espinha dorsal da cidade que nascia, encontrava-se troncos de peroba, carros levantavam nuvens de pó e em dias de chuva só andavam se tivessem os pneus envolvidos em grossas correntes. Carro puxando carro era uma cena comum. “A cidade era praticamente ao longo da avenida Brasil, mas os primeiros bairros, como a Vila Operária, Vila 7 e Zona 4 eram mais distantes e dividiam a população em grupos distintos. Os ricos ficavam na Zona 4, o pessoal que trabalhava na construção foi morar na Vila Operária e o resto do povo foi para outros bairros. Eu comprei um terreno na Vila 7, na rua Bragança. Na época a região era quase só mato, mas em pouco tempo foi sendo aberta e as casas, todas de madeira, foram surgindo até virar uma vila de verdade. Hoje a Vila 7 é uma das melhores da cidade.”

Juvêncio, que na época era praticamente um garoto, teve seu primeiro emprego na antiga Cantina Veneziana, na rua Santos Dumont, em frente à praça Napoleão Moreira da Silva, que na época nem tinha esse nome e nem era uma praça, apenas um descampado que aos poucos recebeu palmeiras, árvores e bancos. Com casa e emprego, o novo maringaense foi aos poucos trazendo sua família. “Vieram pai, mãe, irmãos e outros parentes, que fizeram a vida aqui e aqui morreram.” Ele se casou e aqui criou os filhos.

Depois da Cantina Veneziana, Juvêncio foi trabalhar por conta própria. Foi charreteiro, motorista de táxi, chegou a ter três charretes – o que na época era uma frota -, montou uma bem-sucedida quitanda na avenida Colombo  e depois decidiu ser vendedor de frutas próximo à rodoviária, um bom negócio na época. “Hoje o setor de frutas está fraco. Os supermercados fazem ofertas que arrebentam a concorrência, mas isso é assim mesmo. A gente não ganha muito dinheiro, mas isso não faz diferença. Ainda dá para viver bem.”

Hoje com 83 anos, 64 deles respirando o pó vermelho de Maringá, o pioneiro Juvêncio Pereira dá-se por feliz por ter escolhido Maringá para viver, formar e criar família. Não tem grandes planos para o futuro, a não ser continuar vendendo frutas na mesma esquina em que está há 47 anos e onde espera continuar ainda por muitos e muitos anos assistindo a cidade se modificar.

 

Matéria publicada em O Diário em maio de 2007

 

*Juvencil Aurélio Pereira, nascido em 28.09 de 1.930, morreu  no dia 8 de janeiro de 2014 na casa em que viveu por mais de 60 anos, na Vila 7.

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