A leitura que faltar na infância vai afetar o adulto

Luiz de Carvalho

É na véspera de vestibulares que muitos estudantes vão se conscientizar de que leram pouco durante a infância e começo da adolescência, durante as provas vão sentir o quanto a leitura faz falta e não haverá tempo para recuperar o tempo perdido.

Em uma época em que a tecnologia avança e faz com que surjam meios de comunicação de fácil acesso a todo tipo de conhecimento, é visível que a maioria dos jovens não sabe usufruir desses meios para chegar a informações que lhes sejam úteis.

Além de livros variados, na Biblioteca da CSCB as crianças vão encontrar um ambiente confortável e acolhedor

Estudos mostram que na sociedade brasileira a prática da leitura não é valorizada como instrumento de crescimento pessoal e profissional, mas a situação pode piorar com tantos meninos e meninas priorizando os jogos eletrônicos e abusando dos aplicativos instalados em seus celulares. O normal hoje é ver jovens de olho na tela do celular, não com um livro aberto.

Em Mandaguari, na Região Metropolitana de Maringá, a professora Tânia Maria Gomes da Silva Bezzant trava uma batalha quixotesca para mudar esta realidade e somente agora, depois de mais de 10 anos, sente que começa a ganhar terreno. “Foi muito difícil no começo, mas agora temos um grupo grande de crianças lendo por prazer, se interessando pelos livros, e este é um caminho sem volta. O amor aos livros é para a vida inteira”, diz.

Em 2005, Tânia conseguiu montar uma pequena biblioteca na Comunidade Social Cristã Beneficente, entidade que há mais de 30 anos presta serviço à comunidade carente, mas conseguiu juntar apenas 9 crianças como leitores dos poucos livros disponíveis. Hoje, 11 anos depois, cerca de 200 crianças participam espontaneamente das atividades de leitura, foi criada uma Bebeteca, onde os livros apresentam muitas cores, sons, cheiros e outras para estimular bebês a se interessarem por livros; livros são levados para detentas da cadeia local e semanalmente os conteúdos lidos são debatidos atrás das grades. E há ainda o projeto Livraria na Praça, uma barraca instalada todos os sábados na praça principal da cidade, onde livros são vendidos a partir de R$ 1,99.

“Não basta a gente ficar insistindo com a criança que a leitura feita agora será importante para a vida inteira, é preciso que ela mesma descubra isto e para descobrir ela terá que experimentar, terá que ler até descobrir o tipo de leitura que interessa a ela”, diz a professora, que defende que a família terá uma participação muito grande se os pais e irmãos mais velhos derem o exemplo, deixarem a criança ver que elas leem, conversar em casa sobre livros e conteúdos”.

A professora Tania Gomes apresenta o programa “A hora do conto” numa emissora de rádio de Mandaguari Foto: Portal Agora

A professora, que leciona em duas faculdades de Maringá, trabalha na CSCB e ainda tem tempo para se dedicar à família e apresentar na rádio no programa “A hora do conto”, se diz uma leitora voraz desde pequena, já conseguiu repassar este hábito para a filha Isadora e tem como um verdadeiro troféu em sua luta a garota Flávia, que veio de uma comunidade pobre, se apaixonou pela biblioteca, passou no vestibular logo na primeira tentativa, se graduou em Letras e já fez mestrado em Linguística.

 

Basta começar

A Bebeteca recebe cerca de 40 bebês por dia, que começam ali o contato com os livros – Foto: Gazeta do Povo

“A minha formação é em História, não sou especialista em leitura ou literatura, mas sei a importância que elas têm na formação da pessoa”, diz Tânia Gomes. “Pouco tempo depois que a criança chega à biblioteca e lê os primeiros livros, os resultados começam a aparecer na escola, onde ela apresentará maior domínio da língua e da escrita e será uma criança com maior conhecimento, melhor informada”.

Para a professora, o importante é que a criança comece a ler. Ler qualquer coisa. Daí ela vai descobrir o que gosta mais de ler. Depois passará a se interessar por todos os tipos de leitura. O que começa com as mais simples historinhas vai evoluir para literatura de qualidade, poderá chegar aos clássicos. E quem já adquiriu o hábito, poderá ter facilidade para ler também revistas, jornais e os livros técnicos que vão aparecer na trajetória de qualquer estudante. Quem tem facilidade para ler, entenderá melhor e dificilmente terá dificuldade no entendimento de conteúdos.

Atualmente, várias pessoas levam sua contribuição ao trabalho iniciado há 11 anos, como o ator e diretor de teatro Antonio Campagnolo e professores da Unidade Estadual de Maringá (UEM), que discutem conteúdo de livros com os pequenos leitores, tiram dúvidas e realizam atividades que incentivam o hábito da leitura.

A criadora do projeto hoje sente que sua luta não é mais quixotesca, não é mais murro na ponta de faca, pois está dando bons resultados, já formou dezenas, centenas de pequenos leitores interessados. Mas, Tânia Gomes diz que “isto ainda está no começo” e corre atrás de apoio da prefeitura para que possa ampliar o acervo, ter livros à disposição também em outros lugares, ter mais gente envolvida e, em algum momento, criar livrarias na cidade. Embora Mandaguari seja a cidade mais antiga da região, ainda não conta com livrarias.

 

Matéria originalmente publicada em O Diário

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