Zebra foi a surpresa da primeira eleição para a prefeitura de Maringá

Com quase 40 mil habitantes e a maior arrecadação de tributos da região em 1952, Maringá já teve muito jogo sujo e surpresas na primeira eleição

 

Luiz de Carvalho

 

A história política de Maringá começa com uma eleição em que pouco mais de 20% da população estavam habilitados a ajudar escolher o primeiro prefeito e os primeiros vereadores e apenas 15% compareceram às urnas. Entre quatro candidatos à prefeitura, a escolha foi pelo único que não tinha qualquer experiência política, não representava nenhum grupo importante e nem sequer imaginava um dia ocupar um cargo eletivo.

Foto do arquivo de J. C. Cecílio mostra cena do centro de Maringá na década de 1950

O historiador João Laércio Lopes Leal, responsável pelo Patrimônio Histórico, lembra que eleições não eram novidade para quem morava em Maringá. “Todas as pessoas adultas que estavam aqui tinham vindo de algum lugar, já tinham participado de eleições e traziam vícios das eleições de outros Estados, principalmente a troca de votos por favores, currais eleitorais e votos de cabresto”.

Antes, por duas vezes, uns poucos maringaenses tinham ido às urnas escolher representantes do então distrito de Maringá para a Câmara de Mandaguari. Mas o 9 de novembro de 1952 foi especial. Depois de uns dois meses de acirrada campanha, com candidatos a prefeitos e vereadores percorrendo sítios e fazendas onde hoje ficam os municípios de Maringá, Floriano, Floresta, Iguatemi, Ivatuba, Paiçandu e Doutor Camargo, farta distribuição de telhas, madeira para construção de casas, remédios, óculos, dentaduras e até tecidos, xingamentos,  panfletos difamatórios, brigas em bares e outros fatos normais em eleições do passado, no domingo de sol forte e muita poeira homens vestiram ternos de linho branco, sapatos engraxados e chapéus de massa, e as mulheres escolheram vestidos de festa, chapéus e o melhor sapato para participarem da história da cidade.

Maringá foi a única cidade paranaense a escolher prefeito e vereadores no dia 9 de novembro de 1952. As eleições municipais no Brasil tinham acontecido dois anos antes. A cidade fundada no dia 10 de maio de 1947, data em que a Companhia Melhoramentos  Norte do Paraná lançou a venda de lotes, foi elevada a município em 14 de fevereiro de 1951 e obteve autorização do Tribunal Regional Eleitoral para realizar sua primeira eleição em novembro do ano seguinte.

Apesar de ser a caçula da região, Maringá já vivia um ritmo de desenvolvimento que chamou a atenção de diferentes grupos. Afinal, em 1952 a população de Maringá já era maior do que a de qualquer dos municípios da região hoje, com exceção dela própria e Sarandi, e a arrecadação era maior do que a do município de onde foi desmembrado, Mandaguari.

 

 

Zebra contra a elite

A princípio, com o processo de organização dos partidos, vários nomes surgiram para disputar a prefeitura, quase todos ligados ao comércio, mas o governador Bento Munhoz da Rocha Neto tinha como seu homem de confiança em

Valdemar Gomes da Costa, o Valdemar Barbudo (de chapéu), era o candidato apoiado pela Companhia Melhoramentos

Maringá o comerciante Ângelo Planas, seu correligionário no Partido Republicano (PR) e membro de uma família que já tinha eleito dois vereadores na Câmara de Mandaguari. A Companhia Melhoramentos, dona da cidade, apoiou seu corretor, fazendeiro e industrial Waldemar Gomes da Costa, o Valdemar Barbudo, da União Democrática Nacional (UDN), que tinha sido candidato a prefeito na primeira eleição de Mandaguari; e a classe dos médicos, dentistas e outros profissionais liberais ficou com o médico Raul Maurer Moletta, do PSP, que já tinha sido vereador na Câmara de Mandaguari. O lançamento da campanha de Moletta trouxe à nova cidade o maior líder do PSP no Brasil, o médico Ademar de Barros, que foi governador de São Paulo e disputou a Presidência da República.

A disputa parecia centralizada entre Planas e Barbudo, mas aí surgiu o azarão, o dono de serraria Inocente Villanova Júnior, que não era membro da alta sociedade de então, não morava e nem tinha empresa nas regiões valorizadas do Maringá Velho e do Maringá Novo. Diferente dos seus concorrentes, Villanova nunca tinha se envolvido em eleição, não sabia como organizar uma campanha, não tinha popularidade e morava na Vila Operária, onde residiam saqueiros, motoristas, carpinteiros, poceiros e outras categorias da massa trabalhadora e pobre da cidade.

 

Panfletos e mortes

“Foi uma campanha muito difamatória”, lembra o radialista Antonio Mário Manicardi, o Nhô Juca, que veio do interior de São Paulo contratado para fazer a locução nos comícios de Villanova e acabou sendo um faz-tudo na campanha. “Em um comício na Praça das Charretes, hoje Napoleão Moreira da Silva, tinham vindo muitos caminhões trazendo gente das fazendas de café e, na hora do candidato falar, gente mandada pelos adversários cortou a luz (elétrica) e espalhou entre o povo panfletos falando coisas horríveis do Villanova”.

Outro fato marcante na campanha de Villanova foi um comício no distrito de Floriano. Pessoas de várias fazendas compareceram e, na volta, um caminhão cheio de eleitores tombou próximo a Floresta. Quatro pessoas morreram na hora e 38 foram internadas em uma época em que a cidade tinha poucos hospitais.

Realmente, Planas e Barbudo polarizaram a disputa nas ruas de Maringá e foram os mais bem votados na cidade. Mas Villanova correu por fora e venceu a eleição por conseguir maioria nos sítios de Floresta, Paiçandu, Floriano, Iguatemi, Doutor Camargo, Água Boa, Marilá e Ivatuba.

Vilanova não estava entre os favoritos, não tinha experiência com eleição, mas apoio dos operários e acabou eleito primeiro prefeito de Maringá

Eleito, o prefeito tomou posse um mês depois em uma solenidade improvisada em uma concessionária de veículos na esquina das avenidas Brasil e Paraná e no dia seguinte começou a trabalhar em uma sala de 6 metros por 8, na Avenida XV de Novembro. Todo o patrimônio da prefeitura para o prefeito iniciar o trabalho se resumia a duas mezinhas, quatro cadeiras de madeira e algumas enxadas, enxadões e machados usados para derrubar árvores onde hoje é o centro da cidade.

A primeira Câmara, da qual dois terços dos vereadores eram contrários ao primeiro prefeito, foi composta por dois advogados e sete comerciantes.

 

 

NÚMEROS

8.618 era o número de eleitores do município

2.805 eleitores não compareceram

5.813 pessoas votaram na primeira eleição

5.606 votos bons foram apurados

 

 

NOME PARTIDO VOTOS %

 

Inocente Vilanova Júnior PTB 1.871 32,19
Valdemar Gomes da Cunha UDN 1.725 29,67
Angelo Planas PR 1.707 29,37
Raul Maurer Moletta PSP 303 5,21
Brancos 96 1,65
Nulos 111 1,91
Total 5813 100

 

Primeira confusão

A primeira posse foi marcada por uma grande confusão, conta Manicardi. Naquele tempo, o vereador eleito mais idoso assumia automaticamente a presidência da Câmara e assim o primeiro  presidente foi Arlindo de Souza, homem de pouca cultura, praticamente iletrado e com dificuldade para falar e tomar decisões, além de não ter a mínima ideia sobre o trabalho de uma câmara.

Foi Arlindo quem deu posse a Villanova e aos demais vereadores, mas não sabia conduzir a sessão especial, acabou deixando o microfone à disposição de quem quisesse falar e perdeu o controle, a ponto de muita gente se irritar e ir embora esbravejando.

 

 

NOME PARTIDO VOTOS

 

Basílio Saltchuk PR 225
Mário Luis Pires Urbinati PR 215
José Mário Hauari PR 207
Jorge Ferreira Duque Estrada PTB 263
Arlindo de Souza PTB 258
Joaquim Ferreira de Castro PTB 194
Malachias de Abreu UDN 292
Napoleão Moreira da Silva UDN 291
César Haddad UDN 253

 

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