Com viola na mão e pés sobre a mesa, Américo Dias dita moda, vira prefeito e apanha na rua

O eleitorado maringaense reprovou todos os vereadores da primeira legislatura e inicia o segundo mandato com 100% de renovação na Câmara; da segunda eleição saíram líderes que fizeram carreira e chegaram a importantes cargos na política de Maringá e do Paraná; disputaram a segunda eleição um futuro prefeito, um futuro deputado estadual e o principal líder político da cidade na época, que foi deputado estadual, deputado federal e governador do Paraná

 

Luiz de Carvalho

 

Américo Dias Ferraz ficou rico com o negócio do café, mas não perdeu o jeitão do caipira. Esta talvez tenha sido sua principal arma para ganhar de lavada a segunda eleição municipal da história de Maringá, tripudiando sobre ninguém menos que Haroldo Leon Peres, advogado bem sucedido, professor e empresário que depois foi deputado estadual, deputado federal e governador do Paraná.

Em 1956 Maringá já era uma das maiores cidades do Paraná e, impulsionada pela força da cafeicultura, comércio e prestação de serviço a população já passava de 70 mil habitantes, mais de 80% vivendo na zona rural, a estrada de ferro tinha chegado dois anos antes e por ela os novos moradores chegavam em grandes quantidades e saíam as milhares de sacas de café. Já não existiam muitos tocos de gigantescas perobas na Avenida Brasil e o lado norte da Avenida Colombo (na época chamada de Oficial), que não constava do projeto original da cidade, passava a ser ocupado, nascendo a Vila 7, Vila Progresso, Vila Santo Antonio e Morangueira.

Enquanto Inocente Villanova Júnior era o primeiro prefeito, novas forças políticas foram se formando, principalmente por meio de instituições como a recém-criada Associação Comercial, a igreja católica e os sindicatos de trabalhadores. Dois anos antes, nas eleições para a Presidência da República, governadores, deputados e senadores a cidade teve candidatos e, embora ninguém tenha sido eleito,  alguns nomes passaram a ser considerados fortes para o pleito de 56.

Um dos primeiros políticos da cidade, Ângelo Planas, derrotado na primeira eleição, voltou e as novidades foram o médico José Gerardo Braga, o comerciante Otávio Perioto e Haroldo Leon Peres, vindo do Rio de Janeiro, na época Capital da República. O comerciante Américo Dias, comprador de café, não era levado a sério.

Novo rico, o candidato compra uma patrol e sai pela zona rural consertando estradas durante a campanha eleitoral

Quase analfabeto, Dias chegou a Maringá entre os primeiros pioneiros depois de levar uma vida como peão de fazenda no Estado de São Paulo, foi trabalhador braçal, vendedor ambulante, fez biscates e descobriu que tinha talento para negociar café, que era a base da economia da região. Começou a ganhar dinheiro, montou uma máquina de beneficiamento – que existe até hoje – e ficou milionário em cinco anos.

Quando começou a campanha, um era o candidato do governador, outro do empresariado, outro da Companhia Melhoramentos, mas Américo não era de ninguém. Tanto que não contou com nenhum apoiador expressivo e seus comícios dependiam mais de seu palavreado atrapalhado do que de convidados. Leon Peres, advogado influente e temido orador, era apontado como um dos favoritos.  “Ele ainda não tinha sido eleito para cargo nenhum, mas, consciente de seu talento e potencial, desdenhou da simplicidade do oponente que ameaçava lhe fazer sombra e o chamou de caboclo violeiro”, conta o historiador Reginaldo Benedito Dias no livro “Da arte de votar e ser votado – as eleições municipais em Maringá”.

As gozações dos mais instruídos fizeram Américo reagir. Como era cerealista e conhecia os agricultores, foi para as fazendas falar com seus fornecedores e, de quebra, com a peonada. O jeito caipira que conservava ajudou-o a conseguir uma rápida identificação com o homem simples. “Ele ia para os comícios com uma viola e nem sabia tocar direito”, lembra o radialista Antonio Mário Manicardi, o Nhô Juca, testemunha ocular de todas as campanhas da história de Maringá e participante direto de várias delas.

“O Américo comprou uma motoniveladora e em cima dela fez toda a sua campanha. Arrumava as ruas e estradas, que eram muito mal conservadas pelo município, tocava viola e cantava modas caipiras”, conta Ademar Schiavone, autor do livro “Memórias de um bom sujeito”, um apanhado de crônicas escritas por ele sobre fatos da história maringaense.

Perioto também era tido como um sujeito engraçado e dizem que foi dele a célebre frase “estou aqui desde que tudo era mato, ali onde é a Praça Raposo Tavares eu comi muito veado”.

 


As peripécias do caboclo violeiro contadas em livro

O livro de Donizete de Oliveira e Dirceu Herrero traz completa pesquisa sobre a vida do segundo prefeito de Maringá

Américo Dias Ferraz ficou indelevelmente na história política, mas também no folclore e na crônica policial. Peão que chegou pobre e ficou rico que do dia para a noite, não conseguiu ser aceito na alta sociedade maringaense, analfabeto não conseguiu espaço entre os políticos, já como prefeito foi protagonista de uma briga em que acabou chicoteado em uma barbearia no Centro da cidade, depois a casa do patrão do agressor virou cinzas em um incêndio provocado pelos adeptos do prefeito; depois de sair da prefeitura, Américo Dias estava completamente falido, mudou para São Paulo, tentou se reerguer como revendedor dos automóveis Simca Chambord, mas o negócio por água abaixo e o ex-prefeito de Maringá foi para as páginas policiais ao matar
a tiros um diretor da Simca.

A vida e peripécias do ex-prefeito estão no livro “Américo Dias Ferraz – A saga do caboclo violeiro” escrito pelos jornalistas Dirceu Herrero e Airto Donizete de Oliveira.


 

Enfrentando doutores e ricos comerciantes, o caipira Américo Dias tornou-se o segundo prefeito de Maringá Foto: Patrimônio Histórico de Maringá

No dia 12 de novembro, na primeira eleição depois que Maringá passou a ser cabeça de Comarca, mais uma vez o candidato identificado com o povão superou os representantes da chamada primeira elite maringaense. E assim Maringá ganhou um prefeito que não se preocupava em vestir-se bem, colocava os pés calçados de botas sobre a mesa em que despachava e, quando chegavam comissões de moradores ou vereadores para pressioná-lo, pulava a janela e fugia pelos fundos da prefeitura.

 

 

CANDIDATO PARTIDO VOTAÇÃO %
Américo Dias Ferraz PSP 4200 34,75
Haroldo Leon Peres UDN 2844 23,53
José Gerardo Braga PSD-PDC 2640 21,84
Ângelo Planas PR-PTB 1648 13,63
Otávio Perioto PRP 305 2,52
Brancos 213 1,76
Nulos 238 1,97
Total 12088 100

 

 

Câmara 100% renovada

O médico Luiz Moreira de Carvalho iniciou a carreira como vereador em 1956

A segunda eleição de Maringá foi a única nos 60 de história das eleições na cidade em que não houve sequer uma reeleição na Câmara de Vereadores. Com o aumento da população entre 1952 e 1956, o número de cadeiras na Câmara Municipal aumentou de nove para 15, mas mesmo assim nenhum dos nove eleitos para a primeira legislatura conseguiu, na segunda, votos nem mesmo para se colocar entre os primeiros suplentes.

Entre os eleitos em 1956 estavam o médico Luiz Moreira de Carvalho, que mais tarde seria eleito prefeito, e os dois primeiros representantes da colônia japonesa, Torao Taguchi, que era japonês legítimo e irmão de Kazumi Taguchi, que depois teve sete mandatos na Câmara, e Jorge Sato, que chegou a ser deputado estadual.

 

 

VEREADORES
NOME PARTIDO VOTOS

 

Alceu Hauare UDN 231
Aristino Flauzino Teixeira de Almeida PSP 296
Bonifácio Martins PR 167
Francisco Rodrigues de Melo PSP 246
Heitor Dutra da Silva PSD 497
João Luiz Fabre PSD 409
Jorge Sato UDN 305
Luiz Moreira de Carvalho PR 190
Maurício Donaldo Girardello PSD 273
Miravan Barlavento Salles PSP 216
Pedro Françozo PSD 285
Primo Monteschio UDN 233
Salvador Lopes Gomes PSP 502
Torao Taguchi PSD 265
Ulisses Bruder UDN 450

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