presos fazem teatro

Presos apresentam monólogo baseado em obra de Dostoiévski em teatro lotado

A plateia que lotou o Teatro Barracão, em Maringá, aplaudiu e pé a interpretação de dois presos, que teve o apoio de professores, policiais penais e voluntários

 

Por algumas horas na tarde desta sexta-feira, 23, Rogério Marco Fonseca e Claudeir Fidélis trocaram suas celas na Casa de Custódia de Maringá (CCM) pelo palco do Teatro Barracão, ao invés de serem apontados como criminosos, foram aplaudidos de pé e chamados de artistas por uma plateia formada por professores, escritores, professores e profissionais de teatro e até juiz e dois deputados estaduais. Eles apresentaram ao público uma montagem inédita de “Crime e Castigo”, um clássico de Fiódor Dostoiévski.

 

A apresentação que encantou e emocionou a plateia, emocionou também os artistas, tanto que Rogério já decidiu que quando deixar a prisão vai se dedicar às artes cênicas.

 

A sessão desta sexta no Teatro Barracão foi mais uma etapa de um projeto especial de leitura que o Departamento de Polícia Penal do Paraná (Deppen) propôs aos apenados dentro do programa de Remição pela Leitura, que faz parte do trabalho de ressocialização de presos. O projeto especial, iniciado em fevereiro, começa com a leitura de “Crime e Castigo”, que conta o drama psicológico do jovem Raskólnikov, um estudante de Direito que comete um assassinato e é atormentado pela culpa enquanto paga pelo crime na prisão.

Presos apresentam monólogo

Rogério Marco Fonseca em cena Foto: Stephanie Masson

 

Em todas as unidades penitenciárias do Paraná há presos participando e em Maringá leram “Crime e Castigo” presos que estão na Casa de Custódia, na Penitenciária Estadual de Maringá (PEM) e na Penitenciária Industrial de Maringá – Unidade de Progressão (PIM-UP).

 

Os apenados leram o livro em fevereiro, em março participaram de análises, debates, escreveram resenhas, reescreveram e deram vazão ao pensamento criador elaborando algum trabalho com base na obra. Alguns fizeram pinturas, outros se inspiraram e escreveram poemas, textos em prosa e outras formas. Claudeir e Rogério optaram pelo teatro, embora Claudeir jamais tivesse entrado em um teatro antes.

 

Monólogo, mas a muitas mãos

Mas, eles não estiveram sozinhos. Uma ideia dessas logo atraiu um batalhão de voluntários para adaptar o drama de Raskólnikov para o palco. Os professores Adauto da Silva e Marco Antonio Garbeline se propuseram a dirigir a montagem, sugerir, corrigir, ajudar; Gislaine Valéria Rodrigues e Vânia Cristina de Rossi buliram no texto até encontrar a forma ideal para o palco, cuidaram do figurino e elaboraram a iluminação e o cenário.

presos apresentam peça de teatro

Em plena tarde de sexta-feira o Teatro Barracão ficou lotado para assistir a montagem de Crime e Castigo por presos da Casa de Custódia Foto: Adaulto Silva

 

Por trás dessa equipe, conta-se ainda o apoio do diretor da Casa de Custódia de Maringá, Rafael Alberto Kawanishi, o diretor-geral do Deppen, Osvaldo Messias Machado, que foi quem idealizou e se empenhou pelo projeto especial de leitura, o diretor regional do Deppen Júlio Cesar Franco, a diretora do Ceebja, professora Vilma Biadola, e mais Mário Iwamoto Júnior, Pedro Claudinei Soares, Marco Aurélio Menegildo, Eli Rogério Rocha, Gideão Ferreira e Ana Célia de Souza, além de Luiz Carlos Locatelli, que se encarregou da iluminação.

 

 

Digno de chegar a outros públicos

Claudeir Fidelis fez a apresentação de Dostoiévski, “Crime e Castigo” e o personagem Raskólnikov, situou a obra na história, contextualizou a relação de Dostoiéviski com o sistema prisional e o quanto a trama mexe com quem está cumprindo pena em uma penitenciária. Depois disso, foi a vez de Rogério Fonseca prender a atenção do público com o monólogo elaborado por muitas mãos. O fim foi marcado por prolongada salva de palmas.

 

O deputado estadual Professor Lemos (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Paraná, esteve em Maringá especialmente para prestigiar o monólogo e se desmanchou em elogios. Para ele, trata-se de um espetáculo digno de ser mostrado a outros públicos, em outros palcos, outras cidades. O deputado Evandro Araújo (PSD), também presente, teceu elogios à qualidade e profundidade do trabalho.

 

 

Muito além do cárcere pelo cárcere

O diretor regional do Deppen, Júlio Cesar Vicente Franco, que foi um dos idealizadores do projeto de ressocialização, junto com Osvaldo Messias Machado, disse o envolvimento de tanta gente na montagem teatral mostra o tamanho da importância do projeto na reinserção social de presos e o compromisso de todos, desde os agentes de segurança, professores e voluntários. Ele fez um agradecimento especial ao juiz da Vara de Execução Penal, Fabio Bergamin Capela, que tem sido parceiro, com grande empenho para mudar a vida de pessoas presas.

 

“A Polícia Penal é a polícia mais nova do Paraná, tem cerca de um ano, e ela tem o objetivo de reinserir o indivíduo na sociedade. Não há mais aquela ideia do cárcere pelo cárcere, a pena não é mais somente para punir, ela tem que, de alguma forma, transformar o indivíduo, para que ele mude aquela ação que cometeu”, diz Júlio Franco, complementando que ” nossa corporação entendeu isso e hoje o sistema prisional do Paraná, em especial em Maringá, oferta trabalho de uma forma remunerada para que o preso não seja um estorvo para a familia dele, antes, que ele mesmo cumprindo pena, dê apoio financeiro à família”.
Segundo Franco, a aproximação da família é primordial no processo de ressocialização.

presos apresentam peça baseada em obra de Dostoiévski

Alguns dos vários envolvidos no projeto também foram ao palco responder perguntas da plateia Foto: Stephanie Masson

 

 

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